Blog em Manutenção...

quinta-feira, 24 de março de 2011

O mundo é um grande comércio

 Marcelo Victor

   Se eu dissesse numa única frase, curta e grossa, que “o mundo é um grande comércio”, talvez não causasse o impacto que realmente deveria causar nos meus leitores, nem seria compreendida a profundidade da afirmativa como desejaria que fosse. Então decidi transcorrer algumas linhas a mais para tentar mostrar a partir de qual ponto de vista eu falo isso.
   Um grande comércio, eu digo, pois em todos os aspectos da vida moderna temos como base, relações monetárias, relações de custo-benefício. Por mais incomum que possa soar, é assim que funciona a sociedade baseada no capital.
   Alguém poderia me dizer, então, o que a televisão faz o tempo todo, durante os intervalos do futebol e da novela? E até no meio do futebol e da novela? O que são os “comerciais”? COMÉRCIO.
   Alguém poderia me dizer qual o verdadeiro intuito das guerras? Cada metralhadora na mão de um soldado, cada tanque blindado, cada avião supersônico e cada navio porta-aviões foi fabricado por alguém que o vendeu por um determinado preço a outro alguém. E se tem “alguém” que lucra cada vez que explode um conflito no mundo, tanto com a venda de armamento quanto na reconstrução das cidades destruídas, então a guerra só pode ser um COMÉRCIO.
   Puxando o assunto para algo atual, o risco de um desastre nuclear no Japão é resultado de que? A energia atômica é uma alternativa de energia mais eficiente, e se é mais eficiente, gera menos gasto e mais lucro. Então instala-se uma usina nuclear sobre um terreno que não para de tremer o ano todo, com um alto risco de catástrofe para a população local, em nome do melhor custo-benefício. Ou seja, o “negócio” colocado acima do “humano”. Essa é a regra do COMÉRCIO.
   E assim podemos continuar pontuando outros aspectos como educação, trabalho, lazer, saúde, felicidade, religiosidade, sexualidade, arte, todos se rendendo à lógica comercial. Essa lógica está impregnada em nós e dificilmente conseguimos pensar de forma desvinculada dela.
   Se o filósofo Aristóteles vivesse nos dias de hoje e presenciasse essa época confusa pós-revolução industrial, talvez reformulasse sua famosa frase “o homem é um ser social” para “o homem é um ser comercial”. E o Descartes, então, o que diria? “Penso no lucro, logo existo”. Trágico.



terça-feira, 22 de março de 2011

Não li, mas aprovo!

Ivan Silva

   Garimpando na internet, encontrei um livro fantástico. Ainda não o li, mas só pela pequena e grandiosa sintese no poeirablog.wordpress, dá pra ver que se trata de uma verdadeira preciosidade. É o livro Histórias Perdidas do Rock Brasileiro Vol.1, de Nélio Rodrigues, publicado pela Nipress Editora. De acordo com o blog, a obra revela o espetacular cenário roqueiro que antecedeu a explosão das bandas de rock nacionais dos anos 80. Bandas como The Bubbles (que depois passou a se chamar A Bolha), Analfabitles, Os Selvagens, Módulo 1000, entre outras, fizeram a farra da galera entre os anos 60 e 70, tocando em locais diversos e com uma aparelhagem da pesada, superando o equipamento de muitas bandas conhecidas e de prestígio. Algumas levavam a sério a conhecida filosofia "sexo, drogas e rock n' roll".  Nélio Rodrigues mostra que nem só de Mutantes, Raul Seixas e Secos e Molhados viviam os roqueiros brasileiros naquela dura época de ditadura militar e censura no Brasil.
   Quero ter o prazer de lê-lo, claro, assim que eu o encomendar pela internet e o meu tempo permitir. Quem puder comprar e ler esse livro com certeza conhecerá o fascinante mundo rock n' roll que construiu os alicerses sobre os quais estão os domínios do rock nacional underground e, acredito, do mídiatico. Os roqueiros que a mídia pôs no top of word naqueles tempos muita gente já conhece, não é?  Vale a pena então conferir o que acontecia no submundo, por onde só quem era de fato louco e desejava se libertar e viver a filosofia rock n' roll de verdade caminhava.
    Confira o texto com detalhes sobre o livro e uma entrevista feita a Nélio Rodrigues no Poeira Blog, da grande revista Poeira Zine.

Um abraço a todos!

sexta-feira, 11 de março de 2011

Uma pequena porcentagem de alegria

Marcelo Victor


   É, parece que o mundo está mudando. Pena que a gente só fecha a janela depois que o ladrão já levou a televisão. Mas pelo menos o roubo já está claro pra todo mundo. Do que eu estou falando? Do documentário "Inside Job" de Charles Ferguson que, na madrugada de 28 de fevereiro, levou o Oscar na sua categoria.
   O documentário trata das artimanhas utilizadas por consultores de Wall Street para esconder os rombos que existiam nos bancos espalhados pelo mundo, e levar o problema até um patamar onde a crise estouraria de forma aterrorizante, induzindo a população a aceitar a aprovação de um pacote trilhonário “para salvar a economia americana”.
   Dentre outros envolvidos, o filme retrata a figura de Lawrence Summers, que entre outras proezas, ficou conhecido por declarações polêmicas como recomendar o incentivo à deslocalização de indústrias poluidoras para os países da periferia, e enquanto Reitor de Harvard, decretou a incapacidade da inteligência feminina em lidar com as complexidades das "hard sciences"(Ciências Duras).
   O documentário mostra que Summers faturou uma nota preta ao ministrar palestras remuneradas pelos “senhores das finanças” sobre as maravilhas da desregulamentação financeira. Entre suas idas e vindas ao governo, dedicava-se a assessorar instituições financeiras mediante farta remuneração.
   Enquanto secretário do Tesouro de Clinton, Lawrence Summers trabalhou intensamente para a aprovação no Congresso dos Estados Unidos do Gramm-Leach-Bliley Act. Essa lei derrotou a legislação dos anos 1930, o Glass-Steagal Act, que separava os bancos de depósito, os bancos de investimento, seguradoras e instituições voltadas para o financiamento imobiliário e "fundeadas" na poupança das famílias. As transformações ocorridas no sistema financeiro após isso desataram a livre e brutal concorrência no capitalismo das grandes empresas e das grandes instituições financeiras, segundo Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo, em seu site.
   Para quem não entende muito de economia, que é o nosso caso, basta saber que os bancos que tinham a responsabilidade de cuidar das poupanças e dos financiamentos de imóveis populares, puderam, a partir da nova lei, brincar com o dinheiro alheio no mercado de ações, mesmo existindo o risco de perder tudo. Isso causou a crise.
   Outro caso assustador e também constrangedor, entre tantos de "Inside Job", é o do economista Frederick Mishkin. Ex-membro do Federal Reserve, Mishkin não consegue explicar porque às vésperas do colapso dos bancos da Islândia, produziu um relatório que assegurava a estabilidade do sistema financeiro do país, mediante um pagamento de US$ 124 mil. É incrivelmente grotesca a descoberta tais fatos.
   Mas como eu dizia no início, parece que o mundo está mudando. Digo isso porque essas práticas do sistema financeiro não são novas. A crise de 29, a crise do petróleo na década de 70, todas saíram desse mesmo manual. A diferença é que antes a população ficava alheia a todo o processo. Hoje temos um documentário sendo premiado por mostrar as armações de tais instituições. Vejam só que reviravolta, que progresso. De algum modo, sinto uma pequena “porcentagem” de alegria.


Marcelo Victor é psicólogo, especialista em educação e trabalha no Cerest (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador-TO).